Flor da Morte


Na morte, não. Na vida.

Está na vida o mistério.

Henriqueta Lisboa – trecho de ‘O mistério’ , do livro Flor da Morte


O cemitério estampava, logo na entrada: revertere ad locun tuun. Fui saber o que significava aquilo com o único funcionário no local: o coveiro. Fiquei espantada, porque o coveiro respondeu, automaticamente: – a tradução daquilo escrito ali é: – Volte ao teu lugar.

falas de Donizeti, trabalha em um dos box de flores da Dr. Arnaldo


Donizeti montando um arranjo

Outro vendedor de um box da Dr. Arnaldo


O hábito de colocar flores nos velórios tinha o intuito, nos tempos passados, de encobrir o cheiro da pessoa que morreu. Na época, as pessoas tinham poucos hábitos de higiene, e com o passar do tempo do velório que geralmente durava um dia inteiro ou mais, o corpo começava a exalar mau cheiro.

Essa duração, naquela época, era maior pois não se tinha conhecimentos avançados de atestar a morte, então aguardavam esse tempo para ver se o morto ‘voltava’. Tinham uma técnica de colocar um espelho próximo ao nariz do morto para ver se respirava.

Para Ramiro, a flor embeleza a vida e a morte.

Ramiro, dono de uma floricultura em frente ao Cemitério da Cardeal Arcoverde


Cemitério Cardeal Arcoverde


És todo e és um, apenas.

A plenitude da água,

da pedra,

tens.

E és natural, és puro, és simples como

a água, a pedra.

Henriqueta Lisboa – trecho de ‘O mistério’ , do livro Flor da Morte



fala que antecedeu a cerimônia budista em velório


O que se perdeu foi pouco.

Mas era o que eu mais amava.

Henriqueta Lisboa – trecho de ‘Sofrimento’ , do livro Flor da Morte


Matéria da Agência Pública, sobre pessoas que são enterradas como indigentes, sem nenhum ritual realizado junto às famílias.


Vida / efemeridade
Gerar / Morrer
Criar / Desfazer
Delicadeza / força
Presença / Ausência
Respiro/Conflito


Poema ‘O Mistério’ de Henriqueta Lisboa

O mistério

Na morte, não. Na vida.

Está na vida o mistério.

Em cada afirmação ou

abstinência.

Na malícia

das plausíveis revelações,

no suborno

das silenciosas palavras.

Tu que estás morto

esgotaste o mistério.

Ora a distância perseguias,

ora recuavas.

Era o apogeu ou o nirvana

que tateando buscavas?

Ah! talvez fosse a morte.

Não se sabia quando vinhas

nem quando partias. Eras

o Esperado e o Inesperado.

Grandes navios viajavas

com a mesma estranha gratuidade

com que ao planalto descias

por uma escada de nuvens.

Belo de inconstância e arrojo

com teu lastro de intuições,

a um apelo da noite

todo te entregavas, trêmulo

entre carícias e tempestades.

Que mundo vinha nascendo?

Ah! Talvez fosse a morte.

Conheceste os suspiros,

o lento disfarce do sangue,

as rosas do espírito, as secas

rosas nos dedos trituradas.

Por uma solução ansiavas…

Ah! talvez fosse a morte.

Agora estás poderoso

de indiferença, de equilíbrio.

Completo em ti mesmo, forro

de seduções e amarras.

Nada te açula ou tolhe.

És todo e és um, apenas.

A plenitude da água,

da pedra,

tens.

E és natural, és puro, és simples como

a água, a pedra.

URL de esta publicación:

OPINIONES Y COMENTARIOS